domingo, 6 de abril de 2008

Cura Pauperibus clausula est

Cura Pauperibus Clausula Est
Valdir Perazzo é Defensor Público

Públio Ovídio Nasão, foi um mestre da poesia latina. Com seus versos, suaves e harmoniosos, exerceu influência em Dante, Chaucer, Milton e Shakespeare. É autor de “A Arte de Amar” e “Os Remédios do Amor”. É um clássico. Exerceu também influência na revitalização da poesia bucólica e mitológica do renascimento. Nasceu em 20 de março de 43 a.C, em Sulmo, atual Sulmona, em Abruzos, Itália. Famosíssima, no meio jurídico, é a frase de Ovídio que adotamos como título desse artigo: “Cura Pauperibus Clausula Est”. Isto é, o tribunal está fechado para os pobres.
É muito provável que a assistência judiciária gratuita fosse prestada em Roma, no seu tempo, mas, como ainda hoje, de forma muito precária. São Paulo, o apóstolo que fez chegar o Cristianismo ao Ocidente, e que foi preso estrangeiro naquela cidade imperial, queixou-se alegando que compareceu sozinho ao Tribunal de César. Por quanto tempo os pobres ainda ficarão ao abandono sem acesso à Justiça? Por quanto tempo ainda a célebre frase de Ovídio terá sentido? Não nos enganemos. Enquanto não houver uma Defensoria Pública forte, estruturada nos moldes da Constituição Federal, o tribunal continuará fechado para os pobres.
Tramitam no Congresso Nacional duas propostas de emendas constitucionais. A primeira, tem como autor o ex-senador pernambucano Roberto Freire, e está registrada sob o n° 487/05. A segunda é a de número 144/07. Ambas têm como objetivo conferir à Defensoria Pública os requisitos necessários para que se torne uma efetiva instituição que garanta aos carentes acesso à justiça, direito este que está no mesmo patamar do direito à saúde, educação e segurança. A elas se opõem os coronéis que não desejam ver os pobres comparecendo aos tribunais como cidadãos. Na visão destes, os integrantes das classes sociais de menor poder aquisitivo só devem comparecer à justiça como réus. Nunca como cidadãos, reivindicando direitos.
De qualquer forma, não sou um pessimista. A criação da Defensoria Pública pela Constituição de 1988, já foi uma grande conquista da população hipossuficiente. Apesar das dificuldades das Defensorias Públicas Estaduais, desprovidas que estão de estruturação adequada, em todo o país, os combativos Defensores Públicos se organizam e lutam para fazer valer o texto constitucional. Em Roraima, o Governador comparece à sede da Defensoria Pública e atende aos reclamos dos seus profissionais. Os Defensores Públicos de Pernambuco se encontram em greve. No Estado do Maranhão os Defensores Públicos logram aprovação de uma lei orgânica nos moldes constitucionais. Os Defensores Públicos do Rio Grande do Sul resistem ao tratamento desigualitário que a Governadora daquele Estado promove em relação ao Ministério Público e ao Poder Judiciário. Em todo Brasil há manifestação de luta da Defensoria Pública.
No Estado do Acre não é diferente. A Associação dos Defensores Públicos – ADPACRE, por meio de seus integrantes, demonstra indômita vontade de promoção de câmbios na Defensoria Pública, para efeito de transformá-la em nova instituição. Duas ações diretas de inconstitucionalidade tramitam no Supremo Tribunal Federal – STF, em que os Defensores Públicos do Acre discutem inconstitucionalidades das leis regentes da entidade acreana. Desde o ano passado que a associação procura suscitar entendimento com o Governo para fazer uma reforma legal e constitucional da Defensoria Pública do Acre. No ano de 2008, com sucesso e apoio popular, a associação dos defensores públicos realizou ato público no Fórum local, amplamente divulgado pela imprensa.
E o que querem os Defensores Públicos do Acre? Querem cumprir os seus honrosos ofícios atendendo com dignidade à população que demanda os serviços da Defensoria Pública. Querem fazer a Reforma necessária para dotar a Instituição dos mecanismos necessários ao desempenho de seu efetivo papel. Nessa luta os Defensores Públicos têm encontrado total apoio da população e das entidades vivas da sociedade.
A Assembléia Legislativa já recebeu os Defensores Públicos em audiência pública, ficando claro em discursos de todos os parlamentares, a vontade política da Casa Legislativa no sentido de se atender às reivindicações dos Defensores Públicos. As negociações entabuladas com o Governo, feitas por uma comissão de Defensores Públicos, tem contado com a ajuda política determinada do Presidente do Parlamento Estadual, Deputado Edvaldo Magalhães. O Senador Tião Viana já recebeu a diretoria da associação e lhe garantiu o apoio necessário à estruturação da Defensoria Pública. O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Secção do Acre, Dr. Florindo Silvestre Poersch, em artigo amplamente divulgado na imprensa local e nacional, já manifestou seu apoio à Defensoria Pública, pugnando pela urgência de seu fortalecimento. O Excelentíssimo Senhor Juiz de Direito Edinaldo Muniz, já externou, publicamente, seu apoio aos Defensores Públicos e à sua luta.
Enfim, a campanha dos Defensores Públicos do Estado do Acre caminha para o sucesso. Está em marcha um processo de negociação da Associação dos Defensores Públicos com os técnicos do Governo Estadual, visando à tão sonhada reforma da Defensoria Pública, para efeito de dotar-lhe dos instrumentos legais e constitucionais, fazendo-a um grande instrumento de promoção social e da dignidade da pessoa humana. Existe um calendário de negociações, cujo término não ultrapassará o mês de abril do ano em curso. Temos a convicção de que a célebre frase de Ovídio, no Estado do Acre, muito em breve, por decisão de sua Excelência o Governador do Estado, Binho Marques, encaminhando os projetos ao Poder Legislativo, por ser de sua iniciativa; o que muito fortalecerá ao Órgão, permitindo o acesso do povo à justiça, será apenas uma reminiscência jurídica perdida na noite da História.

quarta-feira, 2 de abril de 2008

Retalhos sobre a Família Leite

Consta dos arquivos da Paróquia de Afogados da Ingazeira, a seguinte certidão de batismo: “Eduardo, pardo, filho natural de Luiza, escravo de Filippe Pedro de Souza Leite, nasceu a oito de outubro de mil oitocentos setenta e três e foi solenemente batizado pelo Pe. Manuel Gomes da Fonseca a treze do mesmo mês e ano, sendo seus padrinhos Joaquim do Nascimento Leite e Amélia do Nascimento Leite. E para constar mandei fazer este assento em que me assigno”. Segue assinatura ilegível.

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Argemiro Leite (neto), por e-mail, relatou-me fato curioso sobre nosso avô, Argemiro de Souza Leite. É Mais ou menos o seguinte. Num dos finais de feira de Bom Jesus, estavam reunidos os irmãos Argemiro, Abílio, Adelino (Cabôclo), Aprígio, Ilídio, e Gonçalo. Na companhia destes se encontravam Pedro de Souza Leite (Pedro de Raimunda) e um senhor conhecido pelo sobrenome Lima. O senhor Lima já estava muito bêbedo (borracho). O nosso avô idem. Nesse momento o afilhado de nosso avô, Pedro de Raimunda, que improvisava, deu início a essa sextilha:

Na Vila do Bom Jesus
Eu bebo e não me aperreio
Seu Lima tá com Jesus
Meu padrinho tá quase cheio
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Nesse momento a sextilha foi interrompida pelo nosso avô.
Não se sabe o que temia como verso final.

sábado, 29 de março de 2008

Curiosidades sobre Família Leite

Curiosidades sobre a família Leite


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Damião Leite conta-nos que a primeira geração da família – descendentes de Filipe Pedro de Souza Leite e Clotildes Ferreira Leite – quando iam à feira na Vila de Bom Jesus, hoje Tuparetama, muitas vezes reuniam-se numa bodega para tomar uma cachacinha ou um vinho. Alguns eram “econômicos”. Tinha um deles que quando acabava de entornar o copo dizia: “eu bebo e vou saindo”. Os que ficavam não perdoavam: “para não pagar”. Faziam coro.

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Dondon, filha de Gonçalo Leite, afirma que seu pai era extremamente coerente com suas posições político-partidárias. Nunca mudou de partido. Seguia fielmente a liderança de Inácio Mariano Valadares. Não traia seu partido mesmo que o candidato adversário fosse seu parente. O Padre João Leite, seu primo, concorreu às eleições Municipais de São José do Egito. Gonçalo Leite comemorou a derrota do primo mandando soltar 12 (doze) dúzias de fogos.

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Uma das filhas de Gonçalo Leite, depois que se casou, foi residir na cidade de Tabira. Casada e morando distante do pai achou que tinha conquistado independência político-partidária. Nas eleições municipais daquela cidade votou em um dos membros da família Pires que não teve sucesso. Visitou o pai quando este já se encontrava moribundo. Aproximando-se do leito perguntou: não está me conhecendo papai? Ao que o velho, depois de um breve silêncio, respondeu lembrando-lhe o nome do candidato derrotado.

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Argemiro Perazzo Leite, filho de Walfredo Leite, conta que seu pai lhe relatou uma das “tiradas” irônicas de Gonçalo Leite. Quase todos os descendentes de Filipe Pedro de Souza Leite tinham engenhos de cana de açúcar. As condições do engenho de Ilídio de Souza Leite eram precárias. Gonçalo Leite não perdoou: “Ilídio corta cana, cambita, mói e ainda seguro o engenho para não cair”.

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É famosa a espirituosidade de Walfredo Leite. Quando ia comprar uma galinha não dava chance ao vendedor. Pegava a ave pelas asas, levantava várias vezes, depois disparava: “é pequena, mas é magra”.

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No Natal de 2007, em jantar de confraternização em uma Pizzaria do Recife, Elisa Perazzo Leite contou-nos que Rogaciano Leite, jovem poeta morando no Rio de Janeiro, combinou com a namorada de irem à praia. No Rio de Janeiro o tratavam pelo sobrenome. Ao chegar muito cedo na casa da jovem, ao tocar a campainha, ouviu a indagação: quem é? Ao que respondeu: é o Leite. Ouviu pronta resposta: deixe na porta.

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Walfredo Leite não admitia crueldade alguma com animais. Em sua propriedade – Sítio Panelas – não permitia que caçassem ou pescassem. Ao sugerirem a ele que colocassem alevinos no seu açude, brincou: “isso quebra um arame...”. Isto é, havendo peixes as cercas são destruídas para a pesca, razão pela qual preferia não ter peixes em seu barreiro.

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Em 1975 eu (Valdir Perazzo Leite) estava estudando em Recife. Meu irmão Argemiro Perazzo Leite, o mais jovem, continuava morando no Sertão (Tuparetama). Ano seguinte é que foi morar em Recife para estudar. Pois bem, naquele ano meu pai, Walfredo Leite e meu irmão caçula foram me visitar. Surpreendi-me vendo meu irmão fumando. Perguntei a meu pai: Argemiro fuma? Ele respondeu: lá em casa só quem não fuma é o louro (papagaio).

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No final do ano de 2007, me encontrava em Tuparetama. Fomos juntos eu, Alda Leite, Nenén de Damião e Argemiro Perazzo Leite, meu irmão, à casa de Dondon Leite, entrevistá-la para o livro de família que pretendíamos escrever. Dondon se comprometeu de me mandar documentos de família. Cumpriu.
Numa folha de caderno relatou-me um fato pitoresco da política de São José do Egito. É mais ou menos o seguinte. Em 1958 Cid Sampaio venceu as eleições para o governo de Pernambuco, derrotando Jarbas Maranhão. Em São José do Egito Inácio Mariano Valadares, da UDN, até a vitória de Cid, estava “de baixo”. Walfredo Siqueira, do PSD, estava na situação. Com a eleição de Cid o quadro se inverteu. Enquanto Walfredo estava “de cima”, valia-se dos bons serviços de um delegado de polícia cujo sobrenome era FALCÃO. O delegado orgulhava-se do sobrenome. Um dos serviços prestados pelo delegado a Walfredo Siqueira era tomar as “peixeiras” dos matutos udenistas, eleitores de Inácio Mariano. Num dia de feira em São José do Egito, o delegado montou piquete em várias estradas para desarmar os feirantes udenistas. À noite Inácio Mariano Valadares fez uma festa no Ideal Club. Registre-se que Inácio havia solicitado de Cid a transferência do delegado que o incomodava. Teve sucesso. O poeta e joalheiro José Mororó, mirando Inácio Mariano, assim o felicitou:


Eu vejo neste distrito
Orgulho piléria e crítica
É triste esta política
De São José do Egito
Só querem tirar a dita
Do homem que tem razão
É triste a situação
Desta vida cangaceira
Udenista sem peixeira
E pessedista sem FALCÃO.

Uma Nova Defensoria Pública para o Acre

Uma Nova Defensoria Pública para o Brasil e para o Acre
Florindo Poersch é Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil/AC

Está em pauta a discussão sobre a Defensoria Pública no Brasil. Tramita no Congresso Nacional PEC (Proposta de Emenda Constitucional) que visa conferir à Instituição os requisitos necessários para desempenhar sua relevante função social. A justificativa de uma das Propostas de Emenda à Constituição Federal, com acerto, diz que um dos instrumentos mais importantes para se galgar à inclusão social é o acesso à Justiça. Não tenho a menor dúvida de que não se promoverá referido acesso à Justiça, sem que haja uma Defensoria Pública estruturada nos mesmos moldes do Ministério Público. À esta importantíssima instituição democrática, fazendo o devido contra ponto.
A Ordem dos Advogados do Brasil comunga com esse entendimento. Tem convicção profunda da importância do que afirma. Mesmo porque, é seu dever pugnar pela boa aplicação da justiça. Com efeito, o art. 44, inciso I, da Lei n° 8.906, de 04 de julho de 1994 (Estatuto), fixa que a finalidade da ordem é “defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado democrático de direito, os direitos humanos, a justiça social, e pugnar pela boa aplicação das leis, pela rápida administração da justiça e pelo aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas”. Sem Defensoria Pública forte não há boa aplicação das leis, rápida administração da justiça, respeito aos direitos humanos e nem justiça social. Inexistirá o próprio Estado de Direito Democrático, sem o qual não há que se falar advocacia: pública ou privada.
Ora, a Ordem dos Advogados do Brasil é a Instituição que disciplina o exercício da advocacia (pública e privada). Os Defensores Públicos, como advogados públicos, são integrantes da Autarquia. Vinculados à ela. De forma que a Ordem, não pode ficar fora desse importantíssimo debate, que se trava no seio da sociedade brasileira. É muito claro o art. 3°, § 1°, do Estatuto da Ordem, no que diz respeito à advocacia pública, aí se incluindo os Defensores Públicos: “Exerce atividade de advocacia, sujeitando-se ao regime desta lei, além do regime próprio a que se subordinem, os integrantes da Advocacia Geral da União, da Procuradoria da Fazenda Nacional, da Defensoria Pública e das Procuradorias e Consultorias Jurídicas dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e de suas respectivas entidades de administração indireta e fundacional”.
Razão pela qual, hoje dirigindo a Ordem dos Advogados do Brasil, Secção do Acre, sinto-me inteiramente à vontade para apoiar a luta dos Defensores Públicos de todos os Estados brasileiros, no escopo de se fortalecer a Defensoria Pública como instituição indispensável à administração da justiça, conforme previsto no art. 134 e parágrafos da Carta Magna. Apoiar a luta da Defensoria Pública é advogar a causa da sua autonomia funcional, administrativa, mas, sobretudo, orçamentária e financeira. Não consigo compreender uma entidade desse jaez sem que tenha a prerrogativa da iniciativa de sua proposta orçamentária. Autonomia funcional e administrativa sem autonomia orçamentária, a meu ver, é marola.
A Ordem dos Advogados do Brasil, Secção do Acre tem pressa em se modernizar, visando atender aos reclamos da sociedade acreana. Nos dois primeiros anos à testa da entidade, já introduzimos as mudanças que deram auto-estima aos nossos advogados. Os Defensores Públicos acreanos vivem a mesma inquietação de câmbios modernizadores. A campanha de sua valorização que hoje promovem, caminha na mesma direção da entidade máxima, aglutinadora de todos os advogados acreanos. Vêem a sociedade se tornando complexa, e por via de conseqüência potencializando-se os conflitos, sem que, por falta de estrutura, tenham condições de atender aos anseios dos milhares de carentes do Estado. Uma Defensoria Pública aparelhada é mais uma instituição do Estado a serviço da comunidade.
As boas relações estabelecidas entre Governo e os Defensores Públicos, visando à aprovação de um conjunto de leis modernizadoras da Instituição da Defensoria Pública, são vistas de forma alvissareira pela Ordem dos Advogados do Brasil. Todas as informações que ouvimos dos Defensores Públicos são de que os entendimentos mantidos entre técnicos do Governo e Comissão dos Defensores Públicos, confirmam que, muito breve, os projetos chegarão à Assembléia Legislativa, onde há um clima propício, por parte do presidente da Casa e dos seus pares, no sentido da aprovação das leis tendentes à estruturação da Defensoria Pública acreana.
Como dirigente da Ordem, que congrega toda à classe de advogados públicos e privados do Estado do Acre, coloco-me à disposição para ajudar na construção desse entendimento que conduz ao fortalecimento de uma das mais importantes instituições de acesso à justiça e a cidadania. A Ordem, hoje por mim presidida, na medida do possível, tem prestigiado a advocacia pública. Dois dos Conselheiros Federais são advogados públicos. Um deles oriunda da classe dos Defensores Públicos e outro da Procuradoria Geral do Estado. Suas duas instituições importantes à ordem democrática que, cada dia, no Acre se fortalece.
Portanto, tenho clareza e convicção de que os Defensores Públicos, já prestando imensos serviços à população carente do Estado, concluído o processo de negociação e aprovadas as leis modernizadoras da Defensoria Pública, darão prosseguimento ao seu trabalho cotidiano, cumprindo a honrosa missão de garantir aos menos favorecidos o acesso à justiça por meio da assistência judiciária gratuita integral, consistente no atendimento aos milhares de carentes que procuram a Defensoria Pública diariamente, demandando a proteção e satisfação de seus direitos individuais, o que contribui, sem dúvida, para que tenhamos uma sociedade justa, fraterna e igualitária do ponto de vista jurídico.

segunda-feira, 24 de março de 2008

O Poeta Rogaciano Leite

Todos da Família Leite temos imenso orgulho em ter como um dos membros do clã, o poeta repentista Rogaciano Leite. O Aedo do Pajéu das Flores, além de bom poeta, foi notável jornalista e advogado.
Recebi de Dondon Leite um folheto de Paulo Cardoso, que contém, daquele bardo, um poema-carta, feito de improviso, no qual faz cobrança de seus devidos honorários, por matérias suas publicadas em um jornal para o qual trabalhava.
Chorei de ri lendo a inédita cobrança. Vejamos:

“São Paulo, 3 de janeiro
Do ano que vai passando.

Meu amigo Alcides Lopes,
Ponha ao lado os envelopes
e vá logo me escutando:
Desejo para o amigo
Um ano novo feliz,
cheio de tanta ventura
que um verso escrito não diz.

Quero que a vida sorria,
Que goze muita saúde,
Que ganhe bastante dinheiro,
que Deus na terra o ajude.

Mas, escute, velho amigo,
o que eu lhe quero dizer:
Já não tenho o que fazer
Com “seu” doutor Marroquim,
Pois na sua vida boa,
nunca se lembra de mim.

Desde janeiro passado
Que o Jornal tem publicado
As produções que remeto...
E enquanto isso se publica
O poeta velho aqui
cansado, chupando o dedo...

Vinte produções mandadas
foram aí publicadas
até com fotografias...
E enquanto eu gasto em retratos,
vejo (ai senhores ingratos)
Minhas “gibeiras” vazias.

Peça a “nota” ao Marroquim
e sapeque para mim
um cheque de lá prá cá.
A vida aqui é espeto!
e nas farras que eu me meto
coisinha pouca não dá.

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“Oh! que saudades que tenho
Da aurora da minha vida
A venta do Nascimento
tão lustrosa e tão cumprida
Neto, profeta pacífico
a traduzir o inglês...
O Sólon lendo o Evangelho
comungando todo mês...

O Hildebrando, alagoano,
com aqueles olhos vermelhos...
O Campelo nos seus “porres”
por mais que venham conselhos...

O Gilberto com seus dentes
Supostos, à flor da boca...
E o Romildo trabalhando
que é mesmo uma coisa louca!

O Andrade Lima escrevendo
com aquele queixo empinado...
E o Leitão...aí, quanto esporro
Nessa turma ele tem dado...

Marroquim na sua pose
“pega” quem sobe e quem desce;
com aquela cara de santo
come tudo que aparece...

Altamiro, o infant-gate
das morenas da cidade,
escreve lá seus purismos
com requintada vaidade.

Oh! que saudades eu tenho
dos tempos que lá se vão,
quando eu empurrava em versos
um vale para o Leitão!...

Meu caro Alcides, socorra
este náufrago infeliz!
Não deixe que aqui eu morra
Só esfregando o nariz!

Receba ainda os meus votos
para um felicíssimo ano!
Remeta o cheque depressa.
Passe bem. Rogaciano.”

Rádio Cultura – Avenida São João, 1285 – São Paulo.

Meio Ambiente, Justiça e Teosofia

Na sexta-feira de Páscoa, estive conversando com uma amiga com quem tenho afinidades espirituais. Ao longo da conversa, sobre o viés fanático de algumas igrejas (denominações) cristãs, relatou-me um diálogo que manteve com uma integrante de uma dessas seitas evangélicas. Sua interlocutora dizia: “você é uma pessoa boa, mas não vai subir”. Isto é, subir para o céu. Por mais que minha amiga tentasse argumentar que era cristã, e que confiava na “Boa Nova” dos Evangelhos, não tinha jeito. “Não subiria”. O pré-requisito da salvação – na visão da indigitada evangélica – era dar testemunho público de que aceitava a Jesus, em posição genuflexa, nas escadarias do púlpito do seu templo, aos pés do pastor que lhe lidera espiritualmente. “Aí subiria”.

Essa visão estreita da vida espiritual não me fez esfriar a fé, mas me retirou o entusiasmo para a prática dos ritos religiosos. Deixei de freqüentar os templos. Enveredei-me no estudo das religiões comparadas. Montesquieu ensinou: “quando se admira uma estátua, faz-se necessário olhá-la de todos os ângulos”. Segui o conselho. Recusei-me ver o mundo e as pessoas apenas pela ótica da minha religião. Tentei compreender a verdade dos outros a partir das suas crenças. Nessa trilha, acabei chegando à Teosofia. Essa sabedoria divina hoje me dá conforto espiritual e motivação para servir à Humanidade. Aliás, a filosofia milenar da Bhagavad Gita exprime essa verdade nos seguintes termos: “Quando o discípulo está pronto, o mestre aparece”.

A pura intuição me levou à Teosofia. Einstein afirmava que a verdade é descoberta pela intuição, precedida pela análise. Jesus não disse que a religião libertaria. Ao contrário, asseverou: “conhecereis a verdade e a verdade vos libertará”. Mesmo porque, com a ciência descobre-se – diz Einstein – os fatos da natureza, mas o homem de consciência realiza valores dentro de si mesmo. A religião, por si só, não faz o homem adquirir consciência. O ser bom não é decorrência de ser instruído numa religião ou ciência. Rohden afirma que o homem pode atingir o pináculo da mais pura ética, sem o recurso de qualquer religião.

No primeiro contato que tive com a Teosofia – a palavra é de origem grega, significando sabedoria divina -, encantou-me o seu lema: “Não há religião superior à verdade”. Isto não quer dizer que ela – Teosofia – queira se impor como portadora da verdade. Não. A crença que une os teosofistas é a de que a verdade deve ser investigada em relação às diversas religiões, à ciência e à filosofia. Seus objetivos são os mais generosos em relação à humanidade: “Formar um núcleo de Fraternidade Universal, sem distinção de raça, credo, sexo, casta ou cor; encorajar o estudo de Religião Comparada, Filosofia e Ciência; e Investigar as leis não explicadas da natureza e os poderes latentes do homem”.

A teosofia teria algo a nos oferecer? À sociedade acreana, encravada em plena Amazônia? Sim. Annie Besant, em seu livro “Os Idéias da Teosofia”, indaga e confirma: “Pensais vós que o pensamento humano é uma força fraca para mudar a natureza humana? Não é antes verdade que o pensamento é o poder que produz todas as grandes mudanças? – Primeiro o ideal, então a ação”. As duas nações européias – Itália e Alemanha – que lograram promover suas unidades nacionais, assim o fizeram graças ao ideal que, firmemente, sustentaram seus patriotas. E, diz Annie Besant, “foi somente quando o ideal inflamou os corações dos jovens que houve força suficiente para o auto-sacrificio que seguiu a espada de Garibaldi, e tornou possível para a Itália transformar-se num povo unido”. A teosofia inspirou um grupo de idealistas (teósofos), sob a liderança de Gandhi, que promoveu a independência da Índia.

Pois bem, a revista “Veja” dessa semana, traz, em matéria de capa, reportagem sobre a Amazônia. Afirma a revista, em tal reportagem, que o aumento do desmatamento – 30% nos últimos meses – se deve a pequena estrutura de fiscalização e que há falta de respeito à lei, para que a agricultura seja praticada na Região, como fato irreversível. O meio ambiente, diz Rossini Correia, em que o ser humano vive e convive, deve ser objeto de decidida e constante preservação, a ser procedida como um dos direito humanos, de vocação transtemporal, porque projetada, também, para a garantia da qualidade de vida das gerações vindouras, em evidente sinal de que aos atores econômicos, sociais, jurídicos e políticos do presente, compete o grave dever do exercício da co-responsabilidade, quanto aos destinos da humanidade”. Os atores, a que se refere Correa, não assumirão sua co-responsabilidade pela preservação da Amazônia, apenas por temor à lei e à fiscalização, como sugere a matéria de “Veja”. Os valores para preservação ambiental, provêem de outras fontes.

Mikhail Gorbachev, em discurso proferido no Fórum Global de Kioto, Japão, em 1993, constata o perigo que corre a biosfera. Entretanto, não põe sua confiança na lei e nem na fiscalização para garantia do meio ambiente equilibrado. O valor preservacionista da ecologia, para ele, vem de outras fontes. Afirma: “Sem uma ecologia do espírito e do pensamento, todos os nossos esforços para salvar a humanidade seriam inúteis. Quando a ciência e a racionalidade não podem mais ajudar, há apenas uma saída: nossa consciência e nossos sentimentos morais. (...) Hoje em dia não basta apenas dizer “não matarás”. O enfoque ecológico pressupõe, acima de tudo, respeito e amor por todas as coisas vivas. É aqui que a cultura ecológica se encontra com a religião”.

A teosofia serviu de inspiração para um grupo de idealistas, sob a liderança de Gandhi, libertar a Índia, sem uso da violência. Poderia sê-lo também para a preservação da Amazônia? Não há dúvida de que isto é possível. Afirma a teosofia: “Porque o pensamento amadurecido, e o desejo amadurecido – são essas as duas asas com as quais podeis subir e atingir a meta que buscais”. Diz mais: “Todo aquele que pode pensar pode ajudar os outros; e todos os que podem ajudar os outros devem fazê-lo”.

Sob a inspiração dessas generosas convicções da teosofia, que muito poderão contribuir para a preservação da Amazônia, no mesmo jaez em que acredita Gorbachev, a Associação dos Defensores Públicos e a Ordem dos Advogados do Brasil, secção do Acre, promovem, nos dias 21 e 22 de abril do ano em curso, às 19:00 horas, no auditório do SEBRAE/AC, importantíssimas palestras, ministradas pela Dra. Isis Resende, cujos temas são: “JUSTIÇA E TEOSOFIA” e Jung e Teresa D´Avila: Um Encontro com o Inconsciente”. Enfim, “Todo aquele que pode pensar pode ajudar aos outros; e todos os que podem ajudar os outros devem fazê-lo”.


Valdir Perazzo Leite é defensor público