quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

BRASILEIRO MORTO NA BOLÍVIA: Uma Morte Anunciada


 
Valdir Perazzo é Defensor Público

 

Mais uma morte de brasileiro em presídio da Bolívia! No dia 13 de fevereiro, foi morto na Vila Bush, em Cobija, Bolívia, um brasileiro que aí se encontrava preso – não importa o seu crime; não havia sido condenado à morte.

Sobre essa questão dos presos estrangeiros, ao longo dos anos venho propondo soluções para o problema. A integração do Brasil com os países vizinhos, implica em maior tráfego de pessoas, e conseqüentemente, cometimento de crimes. A Comunidade Européia resolveu o problema com o instituto da transferência de presos para cumprirem suas penas nos países de origem.

O Brasil, do ponto de vista legislativo segue a mesma trilha. Porém, na prática, a legislação não é cumprida. Em que pese termos  tratados internacionais que permitem a transferência de presos brasileiros em território Boliviano para o Brasil, não exercitamos o Direito, como instrumento civilizatório.  

Em setembro de 2007, morreu torturado e queimado em presídio boliviano, o brasileiro Rafael Carvalho de Oliveira. Sobre esse crime alertei as autoridades brasileiras apontando caminhos legais para que o fato não se repetisse. A morte de outro brasileiro em Cobija, agora no dia 13.02.2013, é uma morte anunciada, já que os meios legais para se evitar tais mortes não são implementados pelo Ministério da Justiça. O artigo está atualíssimo. Vejamos abaixo.  

 

Volto a discutir os problemas do sistema penitenciário do Acre porque constato a atual gravidade porque passa no momento, e vislumbro maiores dificuldades para frente. A questão do preso não é de somenos importância como alguns pensam. O livro dos livros diz que Deus  se preocupa com os encarcerados: “Iavhweh se inclinou do seu alto santuário, e do céu contemplou a terra, para ouvir o gemido dos prisioneiros e libertar os condenados à morte”. Nas minhas atuações junto à Câmara Criminal do Tribunal de Justiça, em reiteradas sustentações orais, tenho alertado os operadores do direito naquele Egrégio Colegiado sobre a atual conjuntura do Sistema Penitenciário local que dar sinais de esgarçamento e poderá soçobrar no futuro.  

Alguns dados estatísticos fazem acender o sinal intermitente de advertência. Em 1999, quando Jorge Viana assumiu o Governo do Estado do Acre, havia 525 presos. Oito anos depois, já temos no sistema penal acreano quase dois mil detentos. Não tenho o número preciso, porém é algo em torno disso. A população do Acre gira em torno de seiscentos mil habitantes.  Artur de Brito Gueiros Souza, professor de Direito Penal da Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, em sua tese de Doutorado intitulada “Presos Estrangeiros no Brasil – Aspectos Jurídicos e Criminológicos” extraiu de pesquisa realizada em 2004 a informação de que o Brasil tem, em média, cento e oitenta presos para cada cem mil habitantes.  O Acre tem o dobro de presos da média nacional. Mais ou menos.

Do livro citado extraio outros dados preocupantes. Em 2004 o Acre tinha onze presos extra-comunitários custodiados na capital. Mesmo com esse pequeno número de presos estrangeiros estava acima de vários outros Estados. Esse grupo era superior aos que se encontravam detidos nos Estados de Minas Gerais, Roraima, Maranhão, Espírito Santo, Goiás, Piauí e Alagoas.  Três anos depois já estamos com cinqüenta e oito presos estrangeiros, assim distribuídos territorialmente: quarenta oito em Rio Branco, dois em Sena Madureira e oito em Cruzeiro do Sul. O número ainda é pequeno? É. Porém, já significa um aumento de quase seiscentos por cento em apenas três anos.  Esse número pode aumentar ainda em maiores proporções? Pode. Haja vista que estamos em rápido processo de integração física com os dois  países que têm no Brasil o maior número de presos: Bolívia e Peru.  Com ambos temos extensas fronteiras e a estrada que nos integrará, por ela transitará bens, serviços e pessoas.  

Portanto, é chegada a hora de discutirmos esses problemas atualmente existentes e os que advirão, sob pena de sermos atropelados pelos fatos. Está certo o poeta: “Quem sabe faz a hora”. Impõem-se a necessidade de um diálogo de instituições e pessoas imbuídas do propósito de pensar o Acre e o seu bem estar. O lema de Ralph Waldo Emerson (A Conduta para a Vida),  a nós se aplica: “Viver, deixar viver e ajudar a viver”.  Na penúltima sessão da Câmara Criminal advoguei a tese procedente de que o sistema penitenciário do Acre pode se esvaziar dos problemas da presença dos estrangeiros e a eles fazer o bem, transferindo-os para seus países de origem, onde possam cumprir suas penas – conforme recomendação da ONU – junto a seus parentes e amigos.

Como Presidente da Comissão de Relações Internacionais da OAB, apoiado pelo Dr. Florindo Poersch tenho suscitado o debate. A sociedade se mobiliza e discute.  Através do “Portal da Segurança” tomei conhecimento de que várias autoridades, dentre elas o Desembargador Samuel Evangelista e o deputado Fernando Melo, interagem para buscarem soluções.

Como contribuição, nesse limitado espaço de um artigo, trago à liça uma pequena  achega.  Em 2006 o Brasil e o Perú firmaram tratado para transferência de presos.  O  Presidente Lula assinou o Decreto n° 5.919, de 03 de outubro de 2006 que promulga a Convenção Interamericana sobre o cumprimento de Sentenças. Esse instrumento permite a transferência de presos dos países membros da OEA. Em 20 de junho de 2007, promulgou-se o decreto n° 6.128 que permite a transferência de presos entre Brasil e Bolívia. Lamentavelmente, Rafael Carvalho de Oliveira, morto sob tortura em cárcere de Cobija (Bolívia), se exercitássemos mais o direito, instrumento de pacificação social, poderia estar vivo numa prisão do Brasil.